Os Graus Capitulares

16/05/2012 20:13

 

Os graus capitulares (15º ao 18º) formam um bloco da História Hebraica, embora o 17º grau tenha mais influência da Cavalaria e das Cruzadas. 
O 15º grau – Cavaleiro do Oriente, ou da Espada – e o 16º – Príncipe de Jerusalém – são inteiramente baseados na Bíblia, nos Livros de Esdras e de Nehemias. Em 539 a.C., Ciro, rei da Pérsia, toma a Babilônia e, em 538, autoriza o povo hebreu, que vivia ali exilado, a retornar à Palestina, embora muitos tenham preferido ficar, constituindo a primeira diáspora (1). Foi a partir desse momento que os hebreus passaram a se denominar judeus, já que, antes disso, o termo judeu, proveniente do latim judaeus, que, por sua vez, deriva do gentílico hebraico yehudhi, referia-se ao elemento pertencente à tribo e, depois, ao Estado de Judá. Saindo da Babilônia, os judeus eram liderados por Nehemias, que tinha o título deAthersata, que significa "governador", tendo ficado, Zorobabel, encarregado da reconstrução do templo. Este, que seria o segundo templo --- construído no mesmo local do primeiro – era concluído por volta de 516 a.C., ainda sob o domínio persa, que iria se estender até 332 a.C.. Da reconstrução desse templo, que teria sido levada a efeito quando o povo judeu estava cercado de inimigos, é que surgiria a lenda de que os obreiros, durante a reconstrução, tinham uma espada numa das mãos e uma trolha na outra.
    Já a lenda ligada ao 16º grau, é de um período histórico ligeiramente posterior: negando-se, os samaritanos, a contribuir com o tributo imposto por Zorobabel, para as despesas de reconstrução, ele enviou uma embaixada composta de cinco cavaleiros à Babilônia, com a finalidade de obter a justiça do rei Dario, que sucedera a Ciro; os samaritanos atacaram os embaixadores, mas foram derrotados. Diante disso, Dario publicou um édito, segundo o qual os samaritanos foram obrigados a pagar o tributo, sob pena de castigos físicos e de confisco de seus bens. Em seu retorno, os cavaleiros foram recebidos pelo povo de Jerusalém, o qual os acompanhou ao templo, com júbilo e entoando cânticos de regozijo. Chegados ao templo, deram conta de sua missão a Zorobabel, que, então, os constituiu "Príncipes de Jerusalém" e os revestiu com tecidos guarnecidos de ouro e com um cordão da cor da aurora, além de uma medalha sobre a qual estavam gravadas uma balança, uma espada, cinco estrelas e as letras D e Z. O 16º grau, assim, complementa o 15º e simboliza a recompensa reservada ao valor, à firmeza e à perseverança nas dificuldades.
    A lenda do 17º grau está relacionada  com os Cavaleiros do Oriente, que foram constituídos cavaleiros na Palestina, em resultado da ação dos cruzados e dos Cavaleiros do Ocidente, que já possuíam uma certa nobreza, antes de partir com as Cruzadas. Essa associação foi fundada para preparar o terreno para futuras Cruzadas e para criar uma união de socorros mútuos, materiais e morais, entre seus membros. Se os dezesseis primeiros graus representam a fase essencialmente judaica, a partir do 17º já se tem o advento do cristianismo e a sua chegada ao Ocidente. E o sistema dos Altos Graus, reunindo as duas estirpes de cavaleiros num só feixe,  criou o 17º grau, o dos Cavaleiros do Oriente e do Ocidente, deixando, assim, a fase judaica e ingressando num segundo período, que pode ser chamado de religioso, m decorrência das manifestações do culto material. O grau, portanto, já se refere a uma fase mais adiantada – não se encaixando, cronologicamente, no contexto dos demais graus capitulares, pois o 18º é de fase anterior – ou, mais precisamente, à época da Cavalaria medieval, que, surgida no meio da anarquia e da tirania do regime feudal, sustentou a ética e os valores morais, que se achavam a ponto de sucumbir.
    O 18º grau, um dos mais importantes, espiritualmente, tem como tema principal a procura da Palavra Perdida e a realização da fraternidade universal, por meio do amor, da Nova Lei, de que fala São João Batista. Historicamente, todavia, o grau situa-se na época de Jesus, quando a Judéia, conturbada pela dominação romana e pelas seitas que disputavam o poder temporal e espiritual, entrava em processo de desagregação, que levaria à destruição de Jerusalém.
    A vida religiosa, em torno do segundo templo, sempre foi muito intensa e tendente a preservar a pureza e a autenticidade das tradições hebraicas, constantemente ameaçadas pelos invasores, que se sucediam, no domínio da palestina. Sob o domínio romano (a partir de 68 a.C.), o país seria, desde 37 a.C., governado por Herodes Magno, preposto de Roma, o qual governaria até 4 a.C., tendo, para marcar sua administração, feito demolir o templo de Zorobabel, para, no mesmo local, edificar o terceiro templo, a partir de 19 a.C. . E foi em torno desse terceiro templo que a vida religiosa foi mais incrementada e agitada, pois a rivalidades políticas e as divergências teológicas haviam dado origem a três seitas, ou partidos religiosos: a dos saduceus, a dos fariseus e a dos essênios.
    Os saduceus formavam o partido sacerdotal e dos poderosos, baseando sua conduta na intransigente fidelidade à Torá (o Pentatêuco), defendendo a supremacia do povo eleito e a grandeza espiritual do templo. Para eles, só as formas legais e as crenças presentes na Torá é que determinavam a fé de Israel. Daí sua extrema severidade em matéria penal e o fato de não aceitarem especulações e interpretações sobre o texto da lei, recebida no monte Horeb, no Sinai. Apegados, ferrenhamente, ao templo, desapareceram com ele (no ano 70). Os fariseus (do hebraico: perushin = separados), admitiam, além da tradição escrita da Torá, uma extensa tradição oral, que dava, aos doutores da lei, autoridade, autoridade para interpretar o texto da Torá, adaptando-o às diversas circunstâncias concretas da História. Sendo uma espécie de ordem religiosa, ao mesmo templo contemplativa e docente, o farisaísmo definiu os conceitos religiosos básicos do judaísmo, os quais iriam ser, em larga escala, utilizados pelo cristianismo: a justiça de Deus e a liberdade do homem; a imortalidade pessoal; o julgamento depois da morte; o paraíso, o purgatório e o inferno; a ressurreição dos mortos; o reinado de glória. Todos esses pontos doutrinários foram levados  à Igreja nascente por Saulo – canonizado como São Paulo – que se dizia "fariseu, filho de fariseus".
    A atividade dos essênios, embora descrita pelos historiadores da época e posteriores, como Flávio Josefo, Filon, Plínio, Dion e Prúsio, só se tornou bem mais conhecida a partir da descoberta dos manuscritos de Cumram (rotulados como "manuscritos do Mar Morto"). Homens e mulheres, vindos de todos os centros comunitários de Israel, viviam agrupados em comunidades, que se consagravam ao ideal da vida religiosa, do silêncio, da oblação e do amor. A entrada nesse círculo de monarquismo implicava o compromisso de viver, conforme a lei mosaica, uma vida de prece, obediência, pobreza, pureza e submissão à vontade de Deus. Na solidão dessa vida retirada é que os ritos religiosos tradicionais iriam adquirir o seu pleno sentido: a purificação pela água, a comunhão dos irmãos no vinho consagrado e o pão dividido no curso das refeições, na cerimônia denominada kidush (sagrado), origem da eucaristia.
    Nesse ambiente é que surgiu Jesus e esse é o momento histórico abordado no 18º grau, no qual, inclusive, são encontrados costumes e ritos tradicionais, embora lhe tenham, também, sido enxertados símbolos reavivados por agrupamentos místicos medievais.
_____________
 
Notas
 
1.     Diáspora (do grego: diasporá = dispersão), designa a dispersão dos judeus, depois da destruição do último templo, em 70 da era atual (9 do mês ab), mas pode se estender ao período babilônio posterior aos retorno dos judeus à Palestina, pois foi na Babilônia que se concentrou a primeira diáspora, pois as comunidades judaicas babilônicas, dirigidas pelo Rosh há golá (cabeça da diáspora), já estavam plenamente desenvolvidas e materialmente estabilizadas, embora lhes faltasse o conforto espiritual, pois, com o templo destruído, rareavam os conhecedores da lei mosaica. Só posteriormente é que os fundamentos de um novo centro de estudo da Torá seriam lançados, com a fundação de novas yeshivot (plural de yeshivá= academia de estudos), enquanto surgia a sinagoga, a Beth-Am (casa do povo), ou Beth ha knesset (casa da coletividade), onde as preces substituíam o sacrifício cruento de animais, tornado impossível, pela destruição do templo.
 
2.     Kidush, da raiz hebraica kodesh = santo, significa, literalmente, santificação, sagração, em relação aos ritos referentes ao vinho e ao pão. Precede os dias de festa religiosa  o shabat (sábado), quando, reunidos em torno de uma mesa, os membros de uma confraria (em hebraico:shaburá), o principal dos convivas lança a sua benção sobre o pão e sobre o vinho, distribuindo-os aos demais. Quando o kidush é realizado antes da pessach (páscoa, passagem, que lembra a saída dos hebreus do Egito), ele é antecipado para a quinta-feira, já que a sexta-feira é reservada aos preparativos do seder (ceia de pessach). Assim, a chamada Santa Ceia, realizada por Jesus, com seus companheiros de shaburá, foi um kidush, realizado antes da páscoa.
 
Fonte: Do livro "O Cavaleiro Rosa-Cruz" – Editora A Trolha – 1997